Janot afirma que argumentação do presidente do Supremo para negar trabalho externo ao ex-ministro provoca insegurança jurídica e pode ter reflexo em outros casos. OAB acusa 'interpretação vingativa'
por Redação RBA publicado 28/05/2014 17:54
ELZA FIÚZA/AGÊNCIA BRASIL
São Paulo – O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse hoje (28) que a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, sobre a necessidade de cumprimento de um sexto da pena antes da concessão do benefício do trabalho externo a presos no regime semiaberto pode causar insegurança jurídica.
Durante apresentação do relatório do Programa Segurança sem Violência, Janot evitou comentários específicos sobre a situação do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, que inspirou Barbosa a promover mudança em jurisprudência consolidada desde 1999. Nos últimos 15 anos havia entendimento firmado dentro do Judiciário de que é possível conceder o benefício do trabalho externo a condenados ao regime semiaberto desde o primeiro dia de cumprimento da pena.
Mas, ao avaliar a situação do petista, condenado no julgamento da Ação Penal 470, o mensalão, o presidente do Supremo mudou esse entendimento e lançou mão do argumento de que o Artigo 37 da Lei de Execução Penal prevê que antes transcorra um sexto da pena. A defesa de Dirceu apresentou pedido para que o plenário da Corte avalie rapidamente a situação e corrija o que considera um erro: o advogado José Luis Oliveira Lima entende que Barbosa apelou a um artigo que diz respeito exclusivamente ao regime fechado. Dirceu está preso no Complexo Penitenciário da Papuda, na capital, desde 15 de novembro do ano passado, condenado a sete anos e onze meses de reclusão – têm direito ao semiaberto todos os sentenciados a menos de oito anos.
Em Brasília, Janot ressaltou que as medidas alternativas ajudam na ressocialização dos presos e devem ser incentivadas para crimes em que o potencial ofensivo seja menos danoso à sociedade. “O problema que se coloca em interpretação de direito é a segurança jurídica. Tínhamos uma interpretação, já de algum tempo, de que não seria necessário o cumprimento de um sexto da pena para que o preso pudesse alcançar o privilégio do trabalho externo. Uma modificação nessa interpretação jurídica pode causar insegurança jurídica. E, em causando insegurança jurídica, pode refletir em demais presos sim”, argumentou Janot.
Sem citar diretamente o ministro Joaquim Barbosa, o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinícius Coêlho, disse que uma mudança na aplicação da regra para aplicação do benefício do trabalho externo a presos condenados a regime semiaberto vai prejudicar 77 mil detentos nessa situação.
“Temos hoje no Brasil 77 mil presos no regime semiaberto. A todos eles, sem discriminação, deve se dado o direito ao trabalho, porque esse é o regime da lei. Não pode haver vitória do discurso da intolerância: se o condenado é inimigo eu devo cumprir a lei, se é amigo não devo cumprir. A interpretação vingativa de um caso concreto não pode prejudicar 77 mil presos nesse regime assegurado por lei”, frisou o presidente da OAB.
A decisão tomada por Barbosa no começo deste mês foi criticada também pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que afirmou não ser lícito que atos administrativos levem a criar na sociedade o “espírito de vingança e de 'justiçamento”. Já a Pastoral Carcerária sugeriu que o caso leve a uma reflexão sobre as más condições dos presos brasileiros em geral, submetidos a interpretações da legislação que servem unicamente para justificar uma determinada visão política dos juízes.
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