Na quinta-feira a PM promoveu uma repressão que revoltou ONGs, políticos e partidos
São Paulo – O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e o prefeito da capital, Fernando Haddad (PT), tomaram rumos distintos no dia seguinte à repressão promovida pela Polícia Militar contra manifestantes contrários ao aumento da tarifa de ônibus, trem e metrô. Enquanto o tucano manteve pé fincado no discurso a favor da truculência, o petista parece ter feito um mea culpa, ao menos nas atitudes, e convocou o Movimento Passe Livre (MPL) para dialogar. No entanto, integrantes do grupo procurados pela RBA dizem ter ficado sabendo do convite pela imprensa.
O encontro será na terça-feira (18), às 9h, em reunião extraordinária do Conselho da Cidade. Segundo nota emitida pela prefeitura, partiu de Haddad a decisão de convocar representantes do movimento e conselheiros. O Conselhão, instalado em 26 de março como canal de diálogo entre a administração e a sociedade, é formado por sindicalistas, políticos, pesquisadores, representantes de movimentos sociais, artistas e líderes religiosos. A participação do MPL não impedirá a realização do quinto protesto pela redução da tarifa, marcado para segunda-feira (17) às 17 horas no Largo da Batata, zona oeste da capital.
Segundo comunicado emitido pela gestão Haddad, os integrantes do MPL poderão iniciar o encontro apresentando propostas. Em seguida, o prefeito e os secretários devem apresentar detalhes sobre a composição do preço da tarifa de ônibus, a evolução da despesa com subsídios e os planos para o sistema de transporte público.
A decisão de Haddad vem após críticas ao MPL e menos de 24 horas depois que a PM detivesse 232 pessoas, várias delas antes mesmo que o ato tivesse início. Ontem, antes do ato, o prefeito criticou o movimento, a quem acusou de na terça-feira agir com violência, e estranhou a falta de liderança. “É o que eles próprios dizem. Que não se coordenam, que não há lideranças, não há responsáveis, ninguém se apresenta como responsável pelo que está acontecendo.”
Apesar de ainda não ter sido convidado formalmente, o MPL confirmou à RBA que participará da reunião, mas deixou claro que integrar o Conselho da Cidade não é o objetivo do grupo quando pede diálogo com a prefeitura. "Queremos espaço de negociação com o prefeito para pedir a revogação do aumento da tarifa, e não apenas para expor nossas motivações e propostas", esclarece Nina Cappello, 23 anos, militante do Passe Livre. "Nossa pauta única é discutir a revogação ao aumento da tarifa. Esperamos uma indicação da prefeitura de que vai abrir mais a gestão dos transporte para a gestão popular."
De acordo com Nina, os militantes do MPL possuem "muito acúmulo de debates" sobre o tema do transporte público. A militante, porém, não soube adiantar exatamente qual será o discurso do movimento durante a reunião do Conselho das Cidades – Passe Livre deve se reunir amanhã (15) para definir sua pauta. Críticas às manifestações públicas de Fernando Haddad sobre as manifestações certamente não faltarão. "O prefeito disse várias vezes que não queremos dialogar. Isso não é verdade", lembra Nina. "Haddad tem nos responsabilizado pelos atos de violência e nos acusado de não controlar os protestos. Ele definitivamente não está entendo o caráter de revolta popular que está marcando luta contra o aumento."
A militante do MPL avalia que as declarações do prefeito podem ser configuradas como um "retrocesso" no discurso do PT, que, lembra, já defendeu a tarifa zero na gestão da ex-prefeita Luiza Erundina, entre 1989 e 1992. "A tarifa zero é um debate político, que se ganha indo para as ruas, fazendo pressão política. Estamos no caminho certo", observa. "Há uma inversão de prioridade no Brasil: se investe 12 vezes mais no transporte privado do que no público. Há ênfase em outras áreas que não seja garantir o transporte público como direito de todos."
O prefeito deve reafirmar na terça-feira que sua administração fez esforço para evitar um aumento maior. Sem reajuste desde 2011, a tarifa sofreu elevação de 6,67%. Os cálculos da administração municipal são de que a aplicação integral da inflação no período levaria o valor a pouco mais de R$ 3,40. Os subsídios oferecidos ao sistema de ônibus ficarão em R$ 1,25 bilhão este ano, e zerar o reajuste demandaria mais R$ 600 milhões.
Enquanto isso, o governador de São Paulo optou por manter o discurso de defesa da repressão e de ataques ao movimento. “A polícia estava trabalhando. Se houve excesso pontual, será apurado”, disse Alckmin hoje de manhã a jornalistas, após cerimônia no Palácio dos Bandeirantes. Ele voltou a acusar os manifestantes de “vandalismo”, afirmando que o movimento tem caráter violento e motivações políticas. “A polícia tem trabalhado para garantir o direito de ir e vir das pessoas. A polícia atua até para proteger os próprios manifestantes.”
A ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, criticou os excessos cometidos, mas atribuiu o erro aos dois lados. “Não é justificável que manifestações utilizem métodos violentos, mas também não é justificável que manifestantes sejam reprimidos de forma violenta”, declarou a ministra à Agência Brasil.
“Os manifestantes devem pensar que atitudes violentas não combinam com a democracia, democracia que o Brasil construiu com manifestações e que exige que todos os protestos sejam feitos exclusivamente na perspectiva do Estado Democrático de Direito, sem nenhuma forma de violência e de depredação”, comentou a ministra. “As forças do Estado não podem agir de forma violenta. Não combina com o Brasil a violência a manifestantes, nem a profissionais da imprensa que estavam trabalhando.”
“Os manifestantes devem pensar que atitudes violentas não combinam com a democracia, democracia que o Brasil construiu com manifestações e que exige que todos os protestos sejam feitos exclusivamente na perspectiva do Estado Democrático de Direito, sem nenhuma forma de violência e de depredação”, comentou a ministra. “As forças do Estado não podem agir de forma violenta. Não combina com o Brasil a violência a manifestantes, nem a profissionais da imprensa que estavam trabalhando.”
Em nota, a CUT afirmou que os "desdobramentos desastrosos" das manifestações mostram que a população paulista está "cansada de ser vítima da falta de uma política de mobilidade urbana". A central cobra ainda a abertura de canais de diálogo entre autoridades e sociedade civil. "Nesse sentido, a CUT se dispõe a conversar com o poder público e apresentar propostas que contribuam para a solução do problema, melhorem a qualidade do transporte coletivo e, consequentemente, a vida dos trabalhadores/as e da população em geral. Sugerimos também a realização de uma conferência para discutir a mobilidade urbana."
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