Para Raimundo Bonfim, da Central de Movimentos Populares, afirmação de que Congresso é reflexo da sociedade não se sustenta, "pois muitos eleitos não foram escolhidos pela maior parte dos eleitores"
por Rodrigo Gomes, da RBA publicado 18/04/2016 17:16, última modificação 18/04/2016 18:31
LUIS MACEDO/CÂMARA DOS DEPUTADOS
São Paulo – Dos 513 deputados federais brasileiros eleitos em 2014, apenas 36 se elegeram atingindo o quociente eleitoral, que é o número de votos equivalente a uma cadeira no parlamento para cada estado. Todos os outros 477 deputados foram “puxados” por candidatos com votações mais expressivas e em alguns estados nenhum candidato atingiu o quociente. Para o coordenador estadual da Frente Brasil Popular, Raimundo Bonfim, a situação afeta a representatividade. “Precisamos fazer uma reforma política. Além de haver a distorção por conta do financiamento de empresas, também há por conta da proporcionalidade. A representação é muito frágil”, afirmou.
Essa diferença aparece na composição da Câmara. As mulheres são 51% da população brasileira, mas ocupam só 10% do Parlamento. Apenas 20% dos deputados federais são negros, enquanto entre a população são mais de 50%. Já os empresários ocupam pouco mais de 40% e os ruralistas, outros 30%. O que deixa o empresariado do campo e da cidade com 70% das cadeiras da Câmara.
“Precisamos de uma reforma política profunda, por meio de uma assembleia nacional constituinte. Porque imagina esse Congresso votando uma reforma política. Eles falam somente em nome dos empresários que financiaram as campanhas deles e não do povo que os elegeu”, afirmou Bonfim. Para ele, a afirmação de que a composição do Congresso é o reflexo da sociedade não se sustenta, “pois muitos eleitos não foram escolhidos pela maior parte dos eleitores”.
O problema é que as pessoas votam em alguns, mas elegem outros. Muitas vezes sem nem saber quem será eleito. Situação que fica mais complicada quando os partidos realizam coligações, pois os votos da coligação valem para todos que dela participarem. E partidos que algumas vezes têm ideais políticas antagônicos, se unem para aumentar a proporção de votos recebidos.
“Enquanto os partidos fizerem esse tipo de coligação sem compromisso programático ou ideológico, vai levar a essa miscelânea aí no Congresso. Poderíamos ter um parlamento muito mais autêntico, muito mais representativo da população”, afirmou o diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) Antônio Augusto de Queiroz, o Toninho, que considera a legislatura atual o Congresso “mais conservador no período pós-1964”.
O deputado federal Celso Russomano (PRB-SP), por exemplo, teve 1,52 milhão de votos na eleição de 2014. E levou junto com ele o também deputado Fausto Pinato (PRB/SP), que teve 22 mil votos. O quociente eleitoral de São Paulo naquele pleito foi de 299 mil votos. Pinato teve menos de 10% dos votos base do quociente eleitoral e apenas 1,4% dos votos de Russomano. Além de ter tido menos votos que outros 156 candidatos.
A quantidade de votos recebidas por Russomano expõe outra característica da distorção do voto proporcional: a escolha de nomes fortes para atrair votos. Dentre os 36 eleitos por voto próprio há artistas e apresentadores de TV, como Tiririca (PR) e Russomano, pastores evangélicos, policiais e parentes de políticos que mantêm o nome da família, como Arthur Virgílio Bisneto e Bruno Covas (ambos do PSDB).
No Congresso, há algumas propostas que alteram o sistema proporcional. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 352, de 2013, estabelece uma cláusula de desempenho para candidatos, exigindo que tenham recebido votos equivalentes a, pelo menos, 10% do quociente eleitoral para ser eleito. A proposta aguarda apreciação na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ).
Já o Projeto de Lei (PL) 6316, de 2013, apresentado pela sociedade civil, prevê dois turnos de eleição para deputados. No primeiro, as pessoas votariam no partido. O que definiria o número de cadeiras a que teria direito cada legenda. No segundo turno, os cidadãos voltariam às urnas para escolher os candidatos que ocupariam os assentos no Legislativo.
O PL 1485, de 2011, propõe que sejam desconsiderados os votos recebidos por um candidato acima do quociente eleitoral. A ideia é que isso limitaria a capacidade dos “puxadores de votos” de eleger outros candidatos da mesma coligação. A proposta está esperando votação na CCJ há três anos.
Outra proposta que surgiu recentemente, já no processo de discussões sobre o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, aceito ontem (17) pela Câmara, é que o Brasil passe ao sistema parlamentarista. Nesse caso, o povo elegeria os deputados e esses elegeriam o primeiro-ministro, que seria o chefe de governo.
Para o coordenador da Frente Brasil Popular, essa proposta seria mais um retrocesso. “Parlamentarismo é outro golpe para diminuir o poder do voto do povo. Fazer isso sem uma reforma política só vai dar mais poder para quem já controla o Congresso. Isso teria de ser decidido em um plebiscito, após a reforma política”, afirmou Bonfim.
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